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Giovani José da Silva

HISTÓRIAS DE ADMIRAR: E AGORA, ARNALDO?

Então é assim: o senhor resolve ir embora, num dia 19 de setembro, sem aviso prévio, sem despedidas, sem aquele pedido de perdão que eu gostaria de ter feito pessoalmente há pouco mais de um ano... Não sei o que de fato aconteceu lá atrás. Aliás, não sei se quero saber, porque não ouvi de seus lábios a palavra dura, que nos afastou. O que me importa são as melhores lembranças que tenho de nossa convivência durante quase 25 anos. Eu o escolhi como “pai postiço”, a referência masculina que eu sempre busquei na infância e na adolescência estilhaçadas. Órfão de pai aos quase 4 anos e, agora, órfão novamente! O senhor ficava todo sem graça quando eu lhe afagava como um filho afaga seu velho pai: um beijo em seu rosto barbudo e o senhor se desmanchava em um terno abraço. Meu “segundo pai”, meu mestre, meu porto seguro em momentos em que o mundo parecia desabar sobre mim. E agora, Arnaldo? Suas aulas de Sociologia, de História das Doutrinas Econômicas ficaram para sempre gravadas em minhas memórias dos tempos da graduação em História, no antigo CeUA. Exemplo de professor, espero chegar um dia a ser parecido contigo. Depois de deixar Aquidauana, ano após ano, eu sempre me fazia presente ou ligava em duas datas muito importantes: no seu aniversário (09 de novembro) e no Dia dos Pais. Eu sabia que jamais teria o status de suas filhas biológicas e tampouco nutria algum interesse que não fosse o afetivo, o do amor filial. Ou melhor: devoção filial. Que alegria quando recebi o Prêmio Victor Civita – Professor Nota 10, em 2001 e ouvi suas palavras de orgulho pela conquista! Seu texto para O Pantaneiro (Um pau rodado), publicado na época, me encheu de mimos e de honra. Uma “cria” acadêmica sua conquistara o Brasil! Fui fazer novela, entre 2005-2006, e, enquanto recebia críticas ácidas por estar me “vendendo”, o senhor me apoiou incondicionalmente e disse: faça o seu melhor! E ainda me aconselhou a colocar em alguma cena tudo o que eu aprendera com os velhos xamãs/ pajés indígenas. Pedido feito, pedido atendido! Ah, “Gordo”, como farão faltas seus conselhos, suas broncas, sua voz grave me chamando de “Preto” e seu jeito bonachão. Escrevo esse texto envolto em lágrimas e saudades, lembrando de seu jeito meio pai, meio amigo, meio confidente, fazendo aqui minhas exéquias. Quanta honra em tê-lo como autor da capa do livro Kadiwéu: Senhoras da Arte, Senhores da Guerra (Volume I), de 2011. Me disseram que o senhor estava aborrecido comigo por seu nome não constar como responsável pela capa do livro. Pedi à Editora CRV que corrigisse o erro, o que foi feito, talvez tardiamente... Não gostaria que tivesse ido embora sem eu poder lhe pedir perdão pela grave falha, pelo descuido, pelo esquecimento. Não foi por desleixo, nem por ingratidão, pode ter certeza. Espero que o senhor, que não acreditava em vida após a morte e nem sei se acreditava em Deus, tenha a paciência de me esperar para que, um dia, nos reencontremos e nos reconciliemos. Eu, como um filho pródigo que volta à casa paterna, arrependido de suas faltas. O senhor, com seus braços abertos, aguardando o desfazimento dos mal-entendidos. Quase não soube do senhor no último ano que passou, mas quero que saiba que sempre esteve em minhas orações, bênçãos e rezas. Queria ter podido lhe contar sobre o fim do relacionamento, a viagem ao Paraguai, as viagens pela Europa, sobre o pós-doutorado (o segundo, “pai”!) e lhe agradecer por tudo o que o senhor representou em minha formação acadêmica, ética, moral. Se me tornei (espero que sim) um homem honrado, um profissional correto, enfim, um “homem de bem”, eu lhe devo tudo isso. Prometo honrar sua memória pelos anos vindouros, professor Arnaldo Begossi.  “Se você gritasse, se você gemesse, se você tocasse a valsa vienense, se você dormisse, se você cansasse, se você morresse... Mas você não morre”. Você é para sempre, Arnaldo!

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