Giovani José da Silva
Não se trata de dom ou vocação, tampouco de alguma missão divina: ser professor é, acima de qualquer coisa, ser profissional! Não damos aulas, pois vendemos nossa força de trabalho em troca de salários (muito baixos no Brasil, por sinal...). O que faz, então um professor? Leciona, ou seja, ministra lições, ensina, prepara, instrui, mas jamais doutrina ou adestra, uma vez que essas não são suas tarefas e nem tem poder para tanto. Aliás, teria o professor algum superpoder? Não sei quanto aos outros, caros leitores, mas o meu é o de acompanhar meus alunos mesmo quando terminam as aulas, pois sei que meus gestos, minhas ideias e palavras os incomodam, mexem com eles, os fazem refletir sobre si mesmos e o mundo que os rodeia. Em outros termos, é saboroso demais saber que minhas lições não se acabam ao final de mais um dia (muitas vezes cansativo para mim e para os alunos) e que as aprendizagens são capazes de transformar miséria, espiritual e intelectual, em puro ouro. Não o ouro de tolo, perseguido por aqueles que desejam apenas fama, sucesso, glórias e muito, muito dinheiro, sem saber sequer interpretar um texto simples ou ser gentil e solidário. Um professor modifica seus alunos, aprendizes de feiticeiro como ele, por meio de atitude, procedimento, domínio de conceitos. Ser professor, um bom professor, não é possuir erudição vazia, aquela que humilha, classifica, hierarquiza, rotula. É, antes, saber que todos têm potencial e podem aprender a “voar”. Alguns voarão alto, outros baixo, alguns com rapidez, outros, ainda, com calma, sem pressa. Os indígenas Kadiwéu do Pantanal de Mato Grosso do Sul, com quem convivi por quase uma década (1997-2004), me fizeram um dia ser escolhido o melhor professor da escola pública brasileira. Isso aconteceu em 2001, quando recebi das mãos do cantor Ivan Lins o Prêmio Professor Nota 10. Quase 20 anos se passaram desde aquele mágico momento no Teatro Abril, em São Paulo, capital, e as lições aprendidas com os “índios cavaleiros” não me saem da cabeça e nem do coração: ser professor ou niGaxinaGanaGa (aquele que sabe que sabe) é transformar a escola em uma usina de sonhos, em que as pessoas possam sair melhores do que quando entraram. Ali, alunos e professores devem aprender sobre o mundo e, também, sobre si e sobre o Outro, respeitando-o e respeitando-se. Um professor digno de sua profissão deve ser um apaixonado por aprender sempre e cada vez mais, alguém que não tenha medo do ridículo, de rir de si próprio (e não dos outros) e nem de cometer erros. Alguém disposto a encarar o seu ofício, a sua arte, a sua profissão como algo sagrado (sem ser religioso), como algo valioso (sem ser monetário). Seu objetivo maior (sempre) não deve ser o ensino de conteúdo maçante, mas a vigorosa aprendizagem dos alunos. Ao invés de se perguntar sobre “o que ensinar para aquele 8.º ano terrível?”, a questão poderia ser “como aqueles inquietos alunos do 8.º ano aprendem – História, Matemática, Ciências etc. – e o que eu posso fazer com meus poderes para que aprendam bem?”. Um professor não é um super-herói, mas ele pode ajudar seu aluno a superar dificuldades que não são apenas cognitivas. Ser professor é atentar para o fato de que não somos feitos apenas de pensamento, mas de sentimento, de emoção, de corpo/ carne! Daí porque não faz sentido deixar de lado os aspectos afetivos/ emocionais/ psicomotores que muitas vezes impedem que um aluno se realize plenamente, em toda a sua potencialidade. O professor que ensina seus alunos a caminhar da heteronomia (sujeição a uma lei exterior ou à vontade de outrem) à autonomia, é o profissional que ajuda o mundo vasto mundo em que vivemos a ter menos autômatos e mais gentes autônomas. Ser professor é, por definição, ser aquele que professa a fé, a esperança de que todos podem aprender – do novo ao velho – e que é preciso ter mais do que boa memória para decorar: é preciso saber com sabor, aprender com vida, expandir corpo, mente, espírito! Eu escolhi ser professor e, atualmente, estou em minha terceira graduação/ licenciatura: aprendi História, Letras/ Espanhol e agora faço Teatro. Nunca desejei ser melhor do que ninguém, mas sempre busquei a melhor versão que pudesse fazer de mim mesmo. Eu, que escolhi não ter filhos, carrego comigo a certeza de que sobreviverei ao tempo, à minha própria morte, pois os futuros professores que hoje ajudo a formar, além de todos aqueles que um dia passaram por minhas salas de aula como alunos, levarão consigo a chama que não se apaga e que é a própria razão do meu viver: a Educação. Muito prazer! Sou Giovani José da Silva, professor!
Voltar ao topo