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Giovani José da Silva

HISTÓRIAS DE ADMIRAR: TEMPO DE ESPERA, TEMPO DE ESPERANÇA

          Voltei a Macapá, no “meio do mundo”, depois de permanecer um ano afastado para realizar estágio de Pós-Doutorado (o segundo!), desta vez em História, na Universidade Federal Fluminense (UFF), em Niterói, Rio de Janeiro. E agora, me pergunto, o que almejo? Tenho dedicado minha vida profissional a estudar populações indígenas, procurando ajudar a compreender o passado e o presente de povos que estiveram (e ainda estão) marginalizados em uma sociedade racista como a que vivemos e que se apresenta ao mundo como uma verdadeira “democracia racial”. Apesar dos estudos em História e Antropologia que realizei junto aos Atikum, Kadiwéu, Kinikinau, Ofayé, Terena, Kamba, Guató, Wajãpi, Palikur e outros, sinto que poderia fazer mais, buscando atingir a um público maior, especialmente de crianças e adolescentes/ jovens. Os eventos acadêmicos têm se tornado cada vez mais enfadonhos para mim, uma vez que ali encontro, invariavelmente, sempre as mesmas pessoas reunidas em reduzidos grupos. Em outras palavras, falamos do mesmo para nós mesmos. Claro que o que fazemos tem muito valor, sentido e significado para mim, caso contrário não estaria envolvido com o labor universitário há quase 10 anos! Ocorre que sinto que é hora de fazer algo que sempre esteve em meu horizonte, mas que necessidades, medos e inseguranças me fizeram adiar: quero estudar Teatro! Quando cheguei à Aquidauana, no início de 1991, para estudar na UFMS, havia feito vestibular para História. Naquele momento não havia esse curso na capital, Campo Grande, tampouco existia o de Ciências Sociais (Antropologia). O fato de ter família na cidade me fez escolher o “portal do Pantanal” como moradia entre 1991 e 1995. Naqueles anos, mesmo estudando e trabalhando bastante, arrumei tempo para organizar os grupos Seiva e Natureza-Viva e com eles me apresentar, dentre outros espetáculos, em “Morte e vida pantaneira”, “Retalhos de um Brasil”, “Retalhos de um Brasil 2” e “O tempo só existe para quem espera” Vinte e três anos se passaram desde que me formei no CeUA e afirmo ter sido longo o tempo de espera para decidir-me por fazer o Enem e tentar uma vaga no curso de Licenciatura em Teatro, na Unifap, onde atualmente sou professor e pesquisador. Não, caros leitores, não pretendo jogar fora todo o tempo em que estive estudando a História dos indígenas, em que me dediquei à Antropologia Indígena e tampouco renegar o dito e o feito, traduzidos em ações ou na escrita de artigos e livros. O que desejo é realizar os sonhos daquele menino que um dia eu fui e que ainda vive dentro de mim, que desejava tanto levar para os palcos verdadeiras histórias de admirar, mas que sabia que nada seria muito fácil naquele momento para ele e sua família. A decisão de fazer História/ história foi das mais acertadas. De que outro modo teria conhecido Aquidauana, o Pantanal, com seus encantos e suas gentes, alguns amigos para uma vida toda e além desta vida? O tempo de espera revelou-se, também, tempo de esperança, ainda que eu não tenha mais o vigor, a vitalidade do jovem de 18 anos. Não me sinto velho, porém! Sinto que em mim há o desejo de aprender o que puder sobre as Artes Cênicas e, depois de formado, levar a um público maior o encantamento dos universos indígenas, com seus pajés, seus espíritos das matas e das águas, suas músicas, suas palavras doces e, algumas, duras! Preconceitos são aprendidos desde a mais tenra infância, seja em casa, no templo religioso ou na escola. Eu gostaria de poder contar por meio do Teatro outras histórias, não as mesmas a que estamos todos acostumados, com fadas, castelos e príncipes/ princesas. Histórias em que crianças de ascendências africana, indígena e de partes do mundo não europeu possam se conhecer/ reconhecer. Histórias que não resvalem para o estereotipado, o folclórico, o exótico, em que crianças e adultos, jovens e velhos, possam se encantar, se envolver e aprender que se estamos longe de sermos, de fato, uma “democracia racial”, podemos caminhar juntos rumo a uma sociedade livre de preconceitos e discriminações, justa e igualitária. Sonho? Utopia? O longo tempo de espera se encerrou e agora pretendo dar início a uma nova jornada, em que terei como companheira e protagonista a Esperança. Saio dos bastidores da História e da Antropologia para encarar os palcos do Teatro. Afinal, de que mesmo é feita a vida, se não de sonhos, utopias e esperanças? 

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