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Raquel Anderson

Morrer na lama!

 

Na enfermidade, muitas vezes, assistir ao estado de inocência que as pessoas se colocam, naturalmente, "legitimamente" , crédulas, porque é humano acreditar na cura!
Assistirmos às fragilidades, a doação, a entrega maior, quando não há mais perspectivas de vida, causa-nos inquietudes...imediatamente substituídas pela nossa capacidade solidária, ahhh, sabemos, o quanto nos arrebatam os relatos com as certezas das curas que não virão, com as melhoras que não acontecerão, o olhar de esperança é a maior lindeza existente no ser humano, ele independe da aparência física, independe da dor, da sua condição social, econômica, é crença na vida, desejo infinito de viver, poesia maior do mundo, é poesia latente!
Nesse contexto, há segurança, doação, dedicação, cuidado, amor, fé, tratamento práticas preventivas, paliativas, esperanças...
A humanidade lida com emoções, com a luta pela manutenção da sua espécie...
No cenário da morte, que pode ser conduzido com calmaria, compreensão, sabedoria, capacidade de superação, aceitação, resiliência, não faz parte do script tragédias e crueldades responsabilizadas pelos nossos semelhantes...
O índice de mortes por afogamentos é elevado, figura, segundo pesquisas, na quarta causa de mortes em adultos, estudos apontam, ainda, que 90% ocorrem em água doce, acidentais, individualmente.
Com a privação de oxigênio, o cérebro humano é capaz de  realizar um mecanismo que retira da pessoa o controle do corpo, como defesa, para evitar alguns problemas. É impossível prender a respiração por muito tempo, e com uma certa taxa de dióxido de carbono no sangue, o cérebro assume o comando, mesmo que a pessoa não queira, involuntariamente, ela respira, isso facilita o afogamento, pois, quando já fadigada, desesperada por lutar contra a água,  exasperada, a pessoa perde forças, aspira muita água, com os pulmões encharcados, têm asfixia,  inconsciência até a morte.
E na avalanche de lama? 
Como morrem as pessoas?
Como morreram os animais?
O que elas sentem?
Como dói?
O que será que passa na cabeça de um trabalhador, de uma trabalhadora, das crianças,  dos idosos ao serem tragados pela lama?
Como é o sentimento desesperador de não conseguir dominar nada, de ser engolido pela lama?
O que sente um coração humano no momento da avalanche de lama, com a certeza que irá parar de bater?
Qual é o sentimento, a dor, o desespero de morrer na lama?
Quantos animaizinhos mortos na lama!
Morremos, todos nós, diariamente, na lama do descaso, na lama das desigualdades, da lama da miséria, na lama da exploração, na lama da execução, na lama do auto exílio, na lama dos preconceitos...
As "necessidades humanas" que geram grandiosas modificações no meio ambiente não podem comungar com tanta crueldade, com tantas irresponsabilidades, com essa grande pressão sobre o meio ambiente.
Evolução e conscientização não coadunam com a ganância do capital.
Têm gente que não é gente!!
A lama, matéria orgânica, que têm matado inocentes brasileiros, que ceifou vidas, causou danos irreparáveis à nossa história, já tão elameada...contudo, o lamaçal humano em que se enquadram os responsáveis por essa tragédia, validado pelo Estado, permanecerão vivos, eles sim, impregnados pela herança fétida, podre, que a lama, incrustada em suas consciências, os conduzirão, eternamente, os marcarão, para sempre, com a lama na alma que eles jamais conseguirão limpar.
Raquel Anderson.

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