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Ruben Figueiró de Oliveira

Idêntica a Rosa de Malherbe

Certa vez o Senador José Fragelli, um dos mais íntegros homens públicos que perlustraram a vida pública deste país, ao saudar da Tribuna do Senado, o rei João Carlos da Espanha, lembrando do compatrício do monarca, Ortega Y Gasset, disse "um país se consolida com o plebiscito do dia-a-dia". O arquetipo senador sul-mato-grossense quis significar a extraordinária ação política de João Carlos, o qual após a derrocada do regime franquista, com persuasão, equilíbrio, tolerância, conduziu o processo de consolidação democrática na Nação Hispânica através do já célebre e ainda não imitado Pacto de Monclôa, que exigiu reiteradas consultas ao seu bravo povo.

Lembrei-me do episódio histórico ao voltar meu pensamento ao tempo da Assembléia Nacional Constituinte, que redundou na conhecida Constituição Cidadã, assim cognominada pelo espírito cívico do grande Ulisses Guimarães - o senhor Diretas Já. Como constituinte pela representação de nosso Estado, procurei com sincero esforço patriótico, inserir no magno texto aquilo que tenho como ideal político. Aliás - permitam-me os caros leitores a imodéstia - alguns pontos da Carta foram de minha autoria, muitos tiveram meu entusiástico voto, como outros tantos deles divergi porque não me convenceram de sua validade para uma nação, como a nossa, que almejava e almeja até hoje, a estratificação de princípios autenticamente democráticos. Não irei relatar neste escrito com minúcias até que ponto alcançaram as divergências; estas já expostas em artigos publicados anteriormente pelas prestigiosas páginas do Correio do Estado e pelo site meticuloso da Midiamax, os quais reunidos devem ser publicados sob o título de "Espelho do Tempo" sob o patrocínio (para minha honra) do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul.

Reservo-me, porém, a oportunidade para afirmar que a Constituição de 1988 envelheceu precocemente, não atingiu a maioridade aos dezenove anos de vigência. Violentada várias vezes pelo arbítrio de presidentes autoritários, sofreu fraturas remendadas por mais de cinqüenta emendas constitucionais; deveria receber, como complemento, um "tratamento plástico" de oitenta leis complementares e que o Poder Legislativo ordinário - preguiçoso como soe ser - somente lhe concedeu algumas poucas e quase por força de conveniências momentâneas.

Para uma Carta Magna exausta (como nossa atual) , tenho para mim que sobre ela o cidadão brasileiro deveria se manifestar claramente através de uma consulta plebiscitária. Evidentemente que tal não poderia ter o condão casuístico como pretende o PT - "ex Catão da moralidade pública que deita e rola na orgia do poder", como ressalta o escritor Gilberto Mello Kunjaski - exclusivamente para dar ao primeiro mandatário mais um mandato consecutivo ao que já exerce, pela segunda vez.

Não, mil vezes não. Consulta plebiscitária para ter valia deveria ser precedida por um amplo debate nacional sobre os temas mais palpitantes da realidade política, social e econômica do país e cujo ritual poderia iniciar-se no período eleitoral das eleições presidenciais de 2010, ocasião em que a efervescência das idéias é empolgante, podendo levar os eleitos ao compromisso de convocar o plebiscito sobre a valia ou não de nova Lei Fundamental.

É praticamente unânime a opinião de consagrados constitucionalistas que um dos maiores defeitos da atual Carta é que ela contém o vício insanável de ter sido elaborada por um conúbio estranho : tinha uma só cabeça pensante - a extraordinária Assembléia Nacional Constituinte e o Congresso Nacional ordinário - mais propensa ao legislador ordinário, senadores e deputados. A conseqüência aí está. Aqui a importância da consulta plebiscitária, teria ela a oportunidade de optar por uma assembléia nacional constituinte exclusiva, idéia pela qual muito lutou o saudoso senador e emérito constitucionalista Afonso Arinos de Melo Franco nos primórdios de 1985. Constituinte exclusiva, ou seja com titulares eleitos com o objetivo único de elaborar e promulgar o texto fundamental. O que ocorrido seus mandatos seriam finitos. Seria, também, uma oportunidade de se maturar a idéia vivificadora do sistema parlamentarista de governo e que marcaria, pela sua essência democrática, a presença permanente do povo nas decisões magnas da nacionalidade, expurgando-se de vez o atual (regime presidencialista) onde prepondera a vontade autoritária do presidente da República.

Uma nova Carta Constitucional não seria como a que hoje nos rege, idêntica à Rosa de Malherbe, formosa quando surge, mas que precocemente perde sua essência!

* Foi deputado estadual, federal constituinte 88, secretário de Estado, conselheiro do Tribunal de Contas. É  suplente de senador.

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