Na sexta-feira 26 de outubro, o presidente Lula visitou o Centro de Pesquisas e Desenvolvimento da Petrobras, no Rio de Janeiro. Colocou óculos especiais e assistiu a um filme sobre áreas de petróleo no fundo do mar. As imagens eram projetadas em terceira dimensão, a técnica na qual a platéia tem a ilusão de profundidade. No dia anterior, Lula recebeu o deputado federal Devanir Ribeiro (PT-SP), seu amigo desde 1969 e secretário-geral do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, quando Lula o presidia. A visita não deveria ter maior importância, assim como o filme da Petrobras. Mas no gabinete presidencial do Palácio do Planalto o que se desenrolava na tarde daquela quintafeira era mais uma cena do enredo do momento em BrasÃlia: o terceiro mandato do presidente Lula.
Como um filme em 3D, esse debate transcorre em múltiplos planos. Em áudio público, o presidente tem sido cristalino, como na comemoração de seus 62 anos numa festinha para militantes petistas em frente ao Palácio da Alvorada: "Esse negócio de achar que tem pessoas que são imprescindÃveis e insubstituÃveis não existe em polÃtica", disse. "A alternância de poder é uma coisa extremamente importante para o fortalecimento da democracia." O dia do aniversário foi o mesmo em que ele viu o filme em 3D. E, como se houvesse imagens cuja real profundidade só é acessÃvel com o uso de óculos especiais, Lula tem tirado de cena todos os possÃveis candidatos da base do governo, enquanto nada faz para conter os defensores do terceiro mandato. O maior deles é justamente o deputado Devanir, autor de uma proposta de emenda constitucional para dar a Lula o direito de concorrer novamente à Presidência em 2010. "Nunca tocamos nesse assunto", diz Devanir. Ele, no entanto, faz a ressalva. "O Lula nunca me desautorizou. Nem me repreendeu." Se efetivamente não pensasse em terceiro mandato, o presidente teria intimidade para barrar a iniciativa de Devanir. Eles dividiram uma cela no Dops, quando Lula foi preso com base na extinta Lei de Segurança Nacional. Juntos, fundaram o PT. Quando Lula chegou ao poder, ajudou Devanir a se eleger deputado federal. As duas famÃlias se freqüentam e Lula e Devanir costumam se encontrar nos finais de semana. "Já perdi a conta de quantas vezes estive no Alvorada", diz o deputado.
"O presidente está agindo com dubiedade", diz o senador Arthur VirgÃlio Netto, lÃder do PSDB. "Ele diz que não quer, mas deixa correr solta a articulação pelo terceiro mandato." Entre aliados do presidente, esse comportamento tem levado a posturas titubeantes de quem vislumbra o jogo subterrâneo, mas não foi convidado a participar dele. "Isso é casuÃsmo", diz, por exemplo, o presidente interino do Senado, Tião Viana (PT-AC). Mas ao mesmo tempo que acha que não se pode "pensar nisso numa democracia madura", Viana acredita que o debate é "muito precoce". Ou seja, talvez o terceiro mandato possa vir a ser uma alternativa. O presidente nacional do partido, deputado Ricardo Berzoini (SP), diz que não há "razão para especulação" porque o próprio Lula descartou a proposta. "Democracia é bom demais e a gente não pode brincar com a democracia em paÃses da América Latina", disse Lula, voltando ao tema pela segunda vez em menos de 72 horas, na véspera de embarcar para Zurique. Marotamente, contudo, Berzoini informa que "não existe assunto proibido" no PT.