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Ciência

Projeto prevê reclusão de 3 a 5 anos para crime de má conduta científica

Os casos raros de condenação criminal quase sempre se relacionam a práticas cujos efeitos não se limitam ao ambiente acadêmico

Halfpoint/iStockPhotos

Fraude em pesquisa científica pode ser tipificada como crime no Código Penal. Aguarda votação no Plenário do Senado o projeto de lei que torna crime a “má conduta científica que atenta contra a integridade científica”. Segundo a proposta, quem violar os padrões éticos de pesquisa nas diversas etapas dos estudos em andamento poderá ser responsabilizado criminalmente. A mudança na legislação tem como objetivo salvaguardar a integridade científica.

O PL 330/2022 acrescenta o artigo 280-A ao Código Penal (Decreto-Lei 2.848, de 1940) e fixa pena de reclusão de três a cinco anos e multa para quem agir em desacordo com a ética em projetos científicos.

De acordo com o autor, senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR), devem ser criminalizados os deslizes éticos resultantes da má fé de pesquisadores, instituições ou patrocinadores, que venham a comprometer a lisura das pesquisas científicas em andamento.

“É inadmissível que pesquisadores ocultem e alterem indevidamente informações sobre centro de pesquisas, participantes, número de voluntários, critérios utilizados, e mortes ocorridas durante o processo de pesquisa visando fraudar os verdadeiros resultados e induzir ao erro. Estamos falando de vidas humanas, de pessoas que acreditavam na lisura da pesquisa científica e foram enganadas. Trata se uma questão de saúde pública que deve ser esclarecida e os responsáveis punidos para que esse fato não sirva no futuro como precedente para novas empreitadas fora dos padrões éticos”, argumenta o senador na justificativa do projeto, que ainda tem um relator.

Proxalutamida
Mecias de Jesus cita o caso da Comissão Nacional de Ética e Pesquisa (Conep), diretamente ligada ao Conselho Nacional de Saúde (CNS), que encaminhou denúncia à Procuradoria-Geral da República (PGR) referente ao teste realizado com a medicação proxalutamida. O ensaio clínico foi patrocinado pela rede de hospitais privados Samel.

A proxalutamida consiste em um bloqueador de hormônios masculinos, ainda em desenvolvimento pela farmacêutica chinesa Kintour. Antes de ser testada para covid-19, a substância era estudada para tumores de mama e próstata.

Em setembro de 2021, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) vetou a utilização da proxalutamida em pesquisas científicas. Contrariando as determinações da agência reguladora e as resoluções do Conep referentes à ética em pesquisa, o teste realizado com esse medicamento provocou 200 mortes no Amazonas.

No relatório encaminhado à PGR, a Conep conclui que os responsáveis pela pesquisa desrespeitaram quase todo o protocolo aprovado pela comissão. Por exemplo, houve autorização para a realização da pesquisa com 294 voluntários em Brasília. No entanto, segundo a comissão, o protocolo começou a ser aplicado sem autorização em 645 pessoas no Amazonas. O perfil dos voluntários mortos também era incompatível com o perfil clínico dos pacientes registrados na pesquisa. A proxalutamida deveria ter sido dada a pacientes leves e moderados de covid-19, mas os resultados indicaram que os óbitos foram por insuficiência renal ou hepática, características de casos mais graves, explica Mecias de Jesus.

Morte de voluntários
Em outubro de 2021, destaca o senador, a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) divulgou, por meio da Rede Latino-americana e Caribenha de Bioética, nota em que cobra investigações sobre a denúncia da morte de 200 voluntários da pesquisa clínica com a proxalutamida no Amazonas. Se confirmado, o episódio representará uma violação aos direitos humanos e uma das infrações éticas mais graves e sérias da história da América Latina, destaca a organização.

Para a Unesco, é igualmente condenável a denúncia de que os pesquisadores, apesar de terem conhecimento dos sucessivos óbitos e dos efeitos adversos graves, continuassem com o recrutamento e a execução dos estudos, em total descompasso com os protocolos de ética em pesquisa com humanos. A organização também considera gravíssima a suspeita de que o comitê científico da pesquisa tenha sido coordenado por pessoas vinculadas aos patrocinadores do estudo, contrariando a necessária recomendação de independência dos comitês para a realização de ensaios clínicos, observa Mecias de Jesus.

Ciência e Tecnologia
Mecias de Jesus ressalta ainda que a Constituição dedica um capítulo exclusivo à ciência e tecnologia, no qual, pela primeira vez, os constituintes manifestaram de modo explícito a importância estratégica do setor para o desenvolvimento sócio econômico do Brasil. O primeiro parágrafo do artigo 218 determina que “a pesquisa científica básica receberá tratamento prioritário do Estado, tendo em vista o bem público e o progresso da ciência”, sublinha o senador.

“Pesquisadores que cometem desvios éticos, como fabricação de dados, em geral são punidos administrativamente com suspensão do financiamento a projetos, proibição de supervisionar alunos ou demissão. Os casos raros de condenação criminal quase sempre se relacionam a práticas cujos efeitos não se limitam ao ambiente acadêmico. No Brasil não há nenhum caso notificado de prisão por fraude em ensaio clínico embora haja inúmeras denúncias contra pesquisadores e instituições de pesquisas por fraude e má conduta científica", conclui Mecias de Jesus.

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